quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

HOMENAGEM PÓSTUMA A UM AMIGO

Ele era um cara judiado pelo tempo e sua aparência estava mais para  um homem na casa dos 70 de idade, mas, a todos dizia ter pouco mais de 50 anos. Comparecia, dia sim e outro também, naquele tradicional  bar da zona sul de  Porto Alegre. Ali, todos os frequentadores o conheciam, no entanto, ninguém sabia seu nome de batismo e quando alguém perguntava-lhe, via de regra,  tergiversava e em tom de brincadeira dizia que era conhecido como   o homem "helicóptero"; ou,  "Tony Bennett" ,o cantor norte-americano com o qual diziam alguns que guardava uma certa semelhança, ou ainda,  pelo apelido  de "plim-plim",  que ganhara de um amigo sem saber a razão de tal acunha. No bar fazia amizade com muita facilidade e por isso ali sentia-se à vontade. Sentava-se sempre no mesmo lugar,  sua mesa preferida situava-se à direita da porta de entrada,  sendo a terceira de uma fileira de cinco. Sua bebida preferencial - até porque seu dinheiro não permitia nenhuma excentricidade  -  resumia-se a underberg com cachaça e três pedras de gelo. Quando questionado por alguém acerca do motivo do gelo, convicto respondia  que era pra ter a sensação de estar tomando um uísque importado de 12 anos. Tomava três goles de seu "uísque", levantava-se e dirigia-se até a rua de modo a acender e fumar um cigarro de qualidade duvidosa. Gostava de conversar e apesar de sua pouca escolaridade - dizia que não tivera a oportunidade de estudar mais -  discorria sobre assuntos variados: futebol - era gremista, mas não dos mais fanáticos; de política, posicionava-se sempre de acordo com seu interlocutor; saúde, tecia sérias críticas ao sistema público, muito embora dele fizesse uso sempre que carecia; música, só ouvia Roberto Carlos, pois em sua ótica era o único que prestava; comida, dizia admirar um bela lasanha de beringela, no entanto, admitia que mal sabia fritar um ovo; mulher, afirmava que não tinha nenhuma fixa posto que era um homem que não nascera para o matrimônio, circunstância que, no seu entender o deixava disponível para vários amores. Perguntado em que trabalhava, respondia  da mesma forma: sou profissional do corte. Alguém perguntava-lhe, és então um alfaiate? Não, claro que não, dedico-me ao corte de gramados, de podas de árvores, etc. E assim, o tempo foi passando nos termos exatos do calendário  e repentinamente e sem prévio aviso, nosso personagem tomou chá de sumiço. Ninguém mais  o vira pelo bairro, indagando-se aqui e ali , soube-se então que ele acometido  de enfermidade grave e terminal veio a falecer  num dia calorento do mês de janeiro.  Seus amigos, sem ter conhecimento de seu passamento não puderam dar-lhe a derradeira despedida e seu enterro deu-se num dia feio, sombrio e triste, ou seja,  verdadeiramente sepulcral.

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